Se eu só puder escrever eu vou escrever. Eu sei. De que me serve? Não sei também. Mas Hilda Hilst me mostrou o quão profundo para as vísceras pode ser o fluxo da escrita.Enfim, estava falando de escrever do que me come por dentro. Sempre esses vermes me abrindo buracos, vermes verdes, brancos, dentuços. Uns Pac Mans. Ai os buracos, seus medos obscuros. Meu eu afundado, esburacado. Aflito. Quem sou eu? Mais essa conversa não poderia ir pra um rumo mais clichê mesmo. Enfim. É a pergunta que nunca dorme. Como pode ser eu dilacerado? Uma vida segura, isso é amor verdadeiro! O cara está falando na TV. Sabe, não me importam se são verdadeiros os amores. Como não seriam se os chamam assim? Eu gosto de amar, gosto também de. Eu só sei ser assim.
Olha, uma parte do meu eu. Caramba. Por que deus só fez a gente com os olhos voltados pra fora? As janelas nos mostram o mundo, mas não nossa casa. Mas também de que adianta? Vai que esse é o sentido mesmo.
Sobre amar. Amar. Talvez isso seja uma das partes do meu problema. Amar demais. Ah não! Por que amar demais? Se amar já é mais um pouco? E esse pouco. Eu quero o orgasmo dos braços, do cérebro e dos tendões. Oh, que imagem. Mas querer não é poder menina, pega o tempo e ponha-o na coleira pra passear. Não vai longe que o jantar vai ficar frio. Ou mofado. Na mesa.
Agora já não sou eu que pareço escrever. É um ser eu. UFA... Mas é um velho de caximbo numa cadeira de balanço na varanda de casa, ou com abajur na sala. Ó, não eu. Mas velha, agora?
E o que me dilacera? Dilacera. Perceba a arrogância da palavra , pois estou em pé. OK, sentei.
Traumas, temos uma vida toda baseada neles. Não uma, todas.
Mas sabe, parece que o fluxo vai virando lagoa. Há. E se eu continuo sem saber o que fazer, continuo. A vida é assim. Pelo menos a minha tem sido. Ainda ando esperando formulinhas mágicas para ter sido. Acontecer. Formulinhas por baixo do tapete ou no bico do pássaro azul.
O melhor dessa maneira de escrever é a sua inocência em ser. Vai sendo.
(1º de maio)
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